《ALÉM DA CORTINA [português]》A CONFEDERAÇÃO - 1,1 - Tempo matéria – União e força.

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Tome, isso é tudo o que tenho. Mesmo que seja pouco, é o sopro da minha vida que compartilho.

- E então, está feliz agora, Sênior? – Nemaiel acolheu o amigo com um grande sorriso. – Isso considerando o quanto você tem alguma culpa nisso. Sua última batalha parece que retirou alguns entraves. E então, feliz?

Sênior olhou por algum tempo para o anjo, o sorriso perdido no rosto. Devagar fechou as grandes asas às costas e as fez sumirem.

- Já não era sem tempo, não é mesmo? Sabe o quanto fico feliz com essa aliança... – falou, deixando os olhos vagarem pelos que estavam ali reunidos.

- Eu sei, meu amigo. Mas, as batalhas vão ser muito duras, você sabe, não é mesmo?

- Acho que um pouco menos com o que foi enfrentado até aqui. As colônias que tentaram se instalar, até agora, não tiveram êxito. Mas, eu sei que irá valer a pena – suspirou. – Já escolheram o comandante?

- Ao que parece Yeshua está sendo instado para aceitar o encargo.

Sênior não conseguiu não abrir mais o sorriso.

- Se isso acontecer, então estará tudo bem.

Então, percebendo algo diferente no amigo, prestou atenção na leitura, logo suspirando pensativo, o olhar perdido em contemplação do rosto angelical.

– Vai mesmo fazer isso, Nemaiel?

Nemaiel ficou em silêncio por um momento. Apesar de já se ter decidido há algum tempo, a pergunta era a que sempre se fazia desde então.

Então sorriu.

- Isso já está mais que decidido. Lúcifer se tornou uma força considerável, mas não é só sobre ele, a escuridão ficou confiante demais, e é hora de botar um freio nessa loucura.

- É certo o que se ouve? Sobre Lúcifer?

- Você fala sobre o ser que o confrontou no seu próprio covil?

- Sim...

- Capturamos alguns demônios e algumas dêmonas, e eles descreveram um ser que invadiu sozinho o covil. Ele não usava armas, porque ele próprio era a arma. Parece que ele apenas desfazia os demônios, como se eles nunca tivessem existido, ou ao menos as coisas e aqueles que se aproximavam demais. A impressão que ficou é que ele poderia ter destruído todos que estavam por lá, até mesmo as próprias entranhas da terra, se esse tivesse sido o seu desejo...

- Está me parecendo um ser desperto, um impartido – Sênior suspirou. – Nada mais sobre ele?

- Não, nada mais. Bem, ele está por aí, e vai aparecer. Há algum entendimento, pelo que foi relatado, de que é alguém que está atuando de alguma outra dimensão, possivelmente da sexta, de onde se espelha.

- É o que me pareceu, pelo que eu ouvi falar.

- Bem, por enquanto sua vontade está sobre os escuros, parece que tentando compreender o que os move. Talvez em algum momento se volte para nós. Vá lá saber...

- É, acho que você tem razão.

- E aí então a confederação se mostra muito mais importante. A união dos mundos de luz em torno dessa confederação que os seus conseguiram ajudar a fazer nascer irá representar toda a diferença. Agradeço demais...

- O mérito é todo seu, meu amigo. Não vai sentir falta das asas?

- Acho que no começo sim. Mas, é apenas um adorno, ao final de conta, não é mesmo? – sorriu de volta.

- Sabe que não é... – devolveu.

- Sim, eu sei, mas é um preço muito pequeno para isso. Com a confederação dos planetas damos uma resposta eficaz para as sombras, sem ferir o livre-arbítrio. Quando o UM retornar veremos como tudo ficará. Por enquanto, é uma boa medida de contenção...

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- Que bom que encontrou um meio de barrá-los, sem ser pela guerra aberta.

- Em termos, Sênior. No começo, até a federação se firmar e ganhar respeito, as batalhas tenderão a ser muito...

- Terríveis?

- Intensas – sorriu.

- É, tudo leva a crer que serão sim. Derfla Edahc, é esse o nome que vai usar?

- Não gostou?

- Sim, gostei sim. Tem... personalidade – sorriu.

- Você olhou com cuidado as linhas de tempo? Seguiu Urântia?

Sênior suspirou lentamente, sentindo aquele peso que não estava querendo em seu coração.

- Eu vi as linhas e segui as com maiores probabilidades. Vou tentar ficar por perto, caso ela precise.

- O sacrifício dela será imenso...

- É a vontade dela – falou, o coração denunciando um peso suave e constante.

- Só sobraram vocês treze como ganedrais. Darão conta?

- Treze é um número bonito, e mais que suficiente. Afinal, não deve esquecer de que quando as novas criaturas surgirem e forem ocupadas pelas centelhas, todos que estiverem no chão de Urântia vão estar esquecidos de quem são e dos poderes que possuem. Será mais fácil assim.

- Eles podem estar esquecidos, mas os poderes serão usados da mesma forma. Você viu como é com os escuros, que também são anjos! Esses novos vão construir uma realidade muito pesada, ainda mais quando as outras criaturas, as que aparentemente serão as mais frágeis, surgirem...

- Eu vi, meu amigo. Mas, tenho certeza de que iremos conseguir.

Nemaiel voltou os olhos para a gigante vermelha. Com um passe amainou a violência de uma erupção do astro, que brilhou numa faixa bem mais agradável.

- Que assim seja e esteja bem – suspirou. - Um dia vocês acabarão descendo, você viu algo nesse sentido? – perguntou, sem se voltar para o ganedrai.

- Há essa possibilidade, mas ainda não está muito definida – suspirou, deixando-se envolver numa imensa lavareda do sol, que passou com suavidade.

- Caso se mostre mais fortemente, acha isso aconselhável? Vocês serão como treze deuses na superfície do planeta, mesmo que coloquem o véu do esquecimento sobre vocês mesmos. Afinal, vocês decidiram não mais se dividir, não é mesmo? Não acha muito poder na superfície?

- Os poderes serão muito diminuídos, e com o passar dos anos seremos tão duramente afetados quanto os que já estão lá. Em todo o caso, você sabe que tem que ser assim... – sussurrou. – Lúcifer fugiu de Urântia, por causa desse novo ser, que ainda precisamos descobrir quem e o que é. Mas, há grande possibilidade dele retornar para Urântia. Lúcifer nunca a esqueceu. Sua vontade está fixada nela, como a de muitos outros demônios. Ele a quer para si e fará tudo ao seu alcance para a subjugar. Ainda tem os dois demônios que o arquianjo encerrou por lá, e tem também Mercator, um caso ainda não resolvido. E Negrumo – falou, a voz um pouco rouca. - Há muita coisa em Urântia, e será preciso muito esforço para ajudar Urântia a manter tudo isso sob controle.

- Mas, e se vocês se perderem, e ao invés de ser uma ajuda se tornarem também aquele que fere, mesmo considerando que seus poderes serão menores?

- Não ignoramos esse risco. Talvez até aconteça de nos perdermos, talvez até aconteça de ferirmos Urântia, mas há algo em nós que Lucífer e os seus não tem: não estamos sós. Somos treze, se lembra? Além disso, agora temos a confederação e...

Sênior parou seus pensamentos, o olhar na face de Nemaiel, que mostrava intensos sinais de desconforto. Sua alegria decaiu, ao imaginar o que seria. Depressa buscou a luz da gigante vermelha, se tranquilizando e se consolando em seu brilho. Resolveu aguardar que o arcanjo lhe desse a notícia. Agora entendia algo que resvalava na sua mente, sem se anunciar claramente. Aquela solidão que vira em torno de Urântia...

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- Talvez essa última possibilidade seja afastada por um tempo bem longo – Nemaiel sussurrou por fim, evitando olhar diretamente para Sênior.

Sênior parou, os olhos tentando ler a face do amigo, avermelhada pelo gigantesco sol.

- Sem a confederação? – falou num fio de voz, confirmando seus receios ocultos. - Essa linha de tempo é tão forte assim? – sofreu.

- Sim, é sim. Há grandes possibilidades, sim. Até que tome definitivamente sua decisão ela ficará sozinha, e dependendo da escolha feita, será colocada sob quarentena, até que vença a experiência sobre a qual está cismando. Não podemos arriscar uma experiência tão densa assim dentro da confederação.

- Mas ela ainda não fez a escolha.

- Mas fará a escolha, por imergir nela ou não. Temos que aguardar. Eu, poucas vezes tive tanto temor. Isso que ela está cismando é algo extremamente perigoso. Ainda não foi conseguido algo assim, um planeta inteiro mergulhar assim na escuridão, dessa forma. O esquecimento só foi conseguido por mônadas individuais, não por um planeta inteiro, com toda sua carga de consciência. Muitos planetas foram destruídos em tentativas como essa. Tememos por ela.

- Eu nunca conheci alguém como ela. Tenho por mim que ela vai conseguir, apesar de também saber que vai ser desesperadamente... doloroso.

- Decepcionado?

- Sim, eu estou... – confessou. – Inúmeras civilizações já passaram por Urântia, e algumas foram maravilhosas. Agora mesmo existem muitas colônias dos espaciais ali. Certo, temos os demônios, anjos e tudo o mais, mas... Esse é o momento em que ela mais precisa de apoio, em que mais precisa de nós – murmurou.

- A decisão não foi minha, Sênior, e nem tenho influência suficiente para reverter isso.

- Eu sei, meu amigo... Então será só isso? Abandoná-la nas mãos dos escuros?

- Quando souberam o que ela pretendia.... Bem, muitos ficaram apavorados, e começou-se até mesmo a aventar uma atitude de zerar a experiência e fazer a substituição da mônada matriz...

Sênior sentiu que ficava sem chão. Os olhos estavam arregalados, ante toda a terrível situação que se apresentava.

- Retirar a mônada planetária e colocar uma outra?

Sênior sentiu uma dor terrível, quando Nemaiel confirmou, os olhos abatidos e tristes.

- Mas, felizmente, eles eram poucos, e foram votos vencidos – sussurrou. - Yeshua se levantou a favor dela e demoveu os conselheiros e governos da confederação. Ele se ofereceu...

- Como?

- Yeshua se ofereceu para descer na experiência, para ser um marcador do caminho. Duas outras centelhas se juntaram a ele, e uma se ofereceu como esposa, e a outra como mãe...

- O ambiente será inóspito demais... – Sênior avaliou com pesar, em sua mente rodando o monstruoso sacrifício que as três centelhas estavam dispostas a oferecer.

- Grupos estão reunidos, para sugerir planos que possibilitem algum sucesso para eles – contou. – Até lá...

- Até lá, como ficam as colônias que já estão instaladas na superfície? É óbvio que, no adensamento da experiência, muitas irão embora, mas algumas podem querer continuar.

- As colônias serão avisadas, e a decisão de permanecerem ou não será delas. Os planetas-mães já estão sendo avisados de que Urântia não entrará...

Bem, não deixará de ser um acontecimento estrondoso, não é mesmo? – Sênior sorriu um pouco entristecido.

- Como se sentirá se acaso ela não sobreviver, como os outros que tentaram e não conseguiram?

Sênior ficou um longo tempo pensando, a mente perdida na face do imenso sol.

- Como já disse inúmeras vezes, ela é uma das mais fortes que conheci – disse por fim. - Nos apaixonamos por ela quando ela ainda nem estava desperta, quando era uma bola de fogo pequena, ainda se formando. Ela já era especial, então. Tenho certeza de que vai conseguir, apesar de todo o sofrimento que isso trará. Mas, caso ela não consiga, eu e os meus irmãos iremos cuidar dela, e vamos levá-la, juntamente com suas consciências, de volta para o UM, para ser renovada.

- Está certo...

- Vá, sei que tem inúmeras providências para tomar. Há muitos que são contra o nascimento da confederação. Nos encontraremos em outros momentos. Akindará, velho amigo.

- Akindará, valorosos ganedrais – cumprimentou a todos, ciente de que a eles Sênior estava aberto. - Chamem, se precisarem.

- O mesmo – disse para o anjo, antes que ele volitasse.

Por ainda um bom tempo Sênior ficou ali, frente ao sol gigantesco, pensando, cismando. Seu coração doía, e não sabia o que fazer, pela primeira vez. Então, uma a um eles foram surgindo, tão silenciosos quanto ele.

- O que viu, Azazel?

- A maior possibilidade é que Urântia entre de vez na experiência, e de que vai conseguir se firmar dentro dela.

- Entendo – falou, a voz pensativa. Azazel era, de longe, a que tinha a maior clareza em examinar as linhas de tempo, e não se lembrava de que ela, alguma vez, já tenha errado.

- Ela vai ficar mesmo fora da confederação?

- Num primeiro momento.

Castiel sentiu uma dor aguda em Azazel.

- O que há, minha irmãzinha?

- Ninguém deveria ser deixado sozinho, num esforço tão grande quanto esse – murmurou sentida.

- Ela não estará – Jophiel sussurrou.

- Os escuros e a luz vão travar batalhas terríveis aqui, por Urântia, que irá se chamar de Gaia – continuou Azazel, a voz baixinha, quase num fio. - Temo que haja grandes possibilidades dela ser destruída. Mas, ela é valorosa, como nunca vi. A linha de que ela vai permanecer é muito forte, apesar das dores que terá que suportar.

Tudo pareceu silenciar e avermelhar ainda mais, parecendo se encaminhar para uma linha, que a princípio, não se mostrara tão promissora e desejada.

- Parece que a linha que tentamos não ver com muita clareza está tomando corpo – sofreu Jophiel.

- Se ela tiver que ser seguida, iremos segui-la, não é mesmo? – perguntou Anaita. Ante o consentimento geral, seus ombros pesaram, e ela deu um sorriso simples. – Se eu estiver com vocês, sei que estará tudo bem, que nunca serei abandonada.

Sênior a puxou para si, envolvendo-a em um abraço amoroso e demorado.

- Somos uma família, umdosirmãos, e para nós só há a possibilidade de continuarmos juntos, esquecidos ou não. Se tivermos que descer em algum momento, se tivermos que lutar nossas batalhas assim, que seja então. Faremos isso! Se tivermos que descer e tivermos que entrar nessa experiência, faremos isso! Se tivermos que morrer mil vezes para evitar que Urântia e seus filhos sejam destruídos...

- Faremos isso!!! – disseram todos os outros ao mesmo tempo.

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