《ALÉM DA CORTINA [português]》OS TARDISCHS E O SER DE LUZ
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para recomeçarem.
EU SOU! Sou luz e sou o arco da flecha de fogo, sou a lança que se torna estaca de flor, e o espinho dela que se torna um forcado. EU SOU!
Sênior baixou a cabeça e sorriu ao ouvir aquela voz, bem sabendo que devia haver um sorriso alegre em cada rosto ali naquela varanda. Ao levantar os olhos não pode deixar de sorrir, como todos os outros, ao vê-los fechando as asas, os modos francos e luminosos.
Com suavidade se expandiu, e viu uma imensidão de exército ao redor do planeta. E do planeta subiam mais anjos, que com eles interagiam, e muitos deles desciam e vagavam felizes pelo planeta, como crianças que tinham pela frente um novo modo de se maravilhar.
Nemaiel e Sênior se levantaram, permanecendo felizes no mesmo lugar. Emanoel, assim que os viu, se aproximou todo cheio de sorrisos.
Emanoel parou à frente de Sênior, o sorriso cheio de luz, parecendo que todo seu ser havia crescido.
- Finalmente ele chegou. Vai dar tudo certo, meu amigo tardisch. Vai dar tudo certo, Sênior.
Sem poder falar Sênior apenas sorriu, vendo a alegria de todos ali. Era fácil ver ondas de luz se dirigindo para ele, como dele se irradiava para todos ali, e não somente anjos. Toda consciência no planeta estava exultante. Gaia estava luminosa.
Sênior o ficou seguindo, vendo o enorme carinho com que era tratado por todos. Então viu seus olhos sorrirem quando o viram, e viu seu sorriso franco e sincero se abrir.
Com alegria retribuiu o cumprimento.
- Que bom que veio, Yeshua – cumprimentou com imensa alegria indicando um lugar onde eles pudessem se sentar.
Yeshua se acomodou ao lado de Emanoel, a face tranquila, os modos em paz.
- Ficamos preocupados quando você foi atacado – contou Nemaiel.
- Pensaram que eu ia ser atacado? – riu.
- Eles pensaram – Emanoel riu também.
- Mas, não foi assim. A escuridão que veio até mim estava repleta de dor, e muitos deles sentiam que a escuridão não mais lhes bastava. Fui eu quem os chamei, fui eu quem pediu que se apresentassem. Foi maravilhoso quando vários deles abriram os olhos e começaram a se lembrar.
- E para onde eles estão indo? – perguntou Uriel vendo aqueles milhares de anjos renovados partindo em todas as direções, maravilhada com aquele ser.
- Eles querem experimentar mais da luz, Uriel. Ah, e como eles agora estão diferentes. Eles estão mais cheios de luz, agora, porque agora sabem a diferença entre luz e escuridão, e luz querem se ver.
E assim, por longas horas, anjos, Emanoel, Yeshua e os tardischs ficaram conversando, rindo e se alegrando um em presença do outro.
Sênior se mostrava mais quieto, praticamente em nenhum momento falando qualquer coisa. Sua mente apenas ficava observando e absorvendo, se lembrando de dias e eras assim, quando eram inocentes no paraíso. Mas não se lembrava com remorso ou saudade, mas apenas como uma lembrança querida, que um dia poderia usufruir novamente.
Para ele aquelas horas eram como um momento de paz e sanidade dentro de uma loucura.
Em dado momento, algumas centenas de tardischs se juntaram num canto, na borda do penhasco, trocando impressões sobre aquelas horas transcorridas enquanto tentavam se decidir sobre seus próximos passos.
Sênior observava cada um deles, e a si mesmo, e novamente sentia aquela sensação desconfortável, que não desejava nominar.
- Eu conheço bem essa sensação, Sênior – os tardischs ouviram atrás de si. – E noto ela em cada um de vocês... A luz em vocês é muito, muito forte. Mas..., a dor também.
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Então se viraram, e deram com Yeshua parado, os olhos azuis postados neles, um sorriso amigo no rosto.
Num movimento simples se sentou, convidando os tardischs a fazerem o mesmo.
- É, todos nós a temos – Haamiah murmurou.
- Típico de almas velhas – Sênior sussurrou. - Já vivemos muito, e de muitas formas. Vimos a luz em diversos matizes, e a escuridão em diversos tons sombreados. Ah, e os olhos, da luz à escuridão, como se modificam.
- Nos dói – confessou Jasmiel com sinceridade e simplicidade.
- Mas,...
- Mas sentem que têm que continuar a proteger a luz – Yeshua completou a frase de Haamiah, que não a conseguira finalizar. - Sabem, meus irmãos, acho que com vocês aconteceu o mesmo que aconteceu comigo. Em um momento me vi separado do UM, e eu e meus irmãos, Elohins que éramos, começamos a construir no vazio que se apresentava a nós. Tomados de uma energia veloz e infantil construímos e destruímos, e por várias e várias vezes fizemos isso. E demos vida e a tiramos, tudo isso entre risos que explodíamos no vazio. Nós procurávamos construir algo que nos enchesse de alegria, algo que víssemos e pudéssemos dizer: agora sim, estou feliz. Mas isso não acontecia, e continuamos a construir e destruir, até que... Até que paramos e olhamos o vazio que fizéramos aparecer novamente, e nos apaixonamos por ele. Então começamos novamente a construir, mas não mais com a alegria arrogante e até desapaixonada da criança que quer experimentar, não mais. Agora começamos a construir com o coração, tocando com amor cada pequenino grão de energia que juntávamos, ao mesmo tempo que amávamos aquele vazio. Cada toque uma construção, cada toque ainda mais carinhoso uma alteração, e tudo entre alegria e sorrisos. Amor, meus irmãos, amor. Essa foi a diferença...
Sênior viu seus olhos se voltando para ele e para os seus. Havia algo diferente neles, naquele fantástico ser impartido.
Então olhou para os outros e para a nuvem de anjos sobre o acampamento, todos como um domo cercando aqueles seres incríveis, como Yeshua e Emanoel.
Em silêncio os tardischs ficaram ali, deixando aquelas palavras entrarem em suas almas como um bálsamo refrescante. Nenhum deles mostrava querer quebrar aquele encanto com um “mas...”.
> Ah, os incríveis e valorosos tardischs. Sinto-me honrado por, finalmente, os conhecer – Yeshua falou, sorrindo para cada um, os cotovelos no joelho, o corpo voltado para a frente.
- O que corre sobre você é maravilhoso – Falou Haamiah. – E a forma como o vimos batalhando contra a escuridão foi... maravilhosa.
- Ah, meu querido Haamiah, aquilo não foi uma batalha; aquilo foi um encontro – riu satisfeito. – Aquele foi um encontro entre irmãos.
- Sempre é, não é? – Sênior falou, a voz baixa e um pouco distante. – Sempre tudo é sobre irmãos.
- Sim, sempre é, Sênior. Sênior, o portador da vintana, a que finaliza. Ao menos é o nome que ela tem, não é mesmo? E é essa a pergunta que fica, não é mesmo? Por que essa finalização não ocorre, não é isso?
- Há uma resposta para isso?
- Há sim, e como anjos impartidos vocês bem sabem, apenas a deixaram num canto por um momento, porque se disseram que não havia alternativas – sorriu amável. – Mas, tal como os irmãos esquecidos que me procuraram, vocês também estão despertando de sua raiva. Não termina, meus irmãos, porque vocês não querem que termine.
Um tardisch corpulento de modos pesados, apesar de gentis, levantou a cabeça, cismando.
- É o que ouvimos. Muitos se perguntam que papel desempenhamos...
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- Sabem, tardischs, a preocupação do nosso irmão Nemaiel, e de tantos outros, não é injustificada – Yeshua falou. - Vocês são muito importantes para nós, e a dor de vocês a muitos outros afeta, sabem disso. Cada um escolhe o que vai experimentar, e cabe sim, a cada um de nós, ter compaixão pelas escolhas feitas. Já vi muitos seres de luz caindo vertiginosamente, como vi muitos deles subindo como um cometa dos buracos mais sombrios. Experiências, experiências. Vocês, meus amigos, são impartidos, seres de grande poder e compreensão, e são muito observados.
- Ah, a escuridão... – gemeu Amadiel, a voz grossa e meio engasgada.
- A escuridão é um aspecto do Pai, e é assim que deve ser vista – falou com intenso carinho. – Quando vocês combatem, como combatem, reforçam a escuridão neles. E é assim que vocês os criam, como eles criam vocês.
Sênior levou como que um baque e levantou os olhos, encarando o rosto daquele ser. Por mais incrível que possa parecer, ali estava uma verdade que sentira inúmeras vezes, mas que sempre deixara passar.
- Aceitar então, é o que nos resta? – ouviu Zaniel sofrer, e viu que ele, preso em sua dor, não ouvira o que fora dito, como parecia ter acontecido com todos os outros. E Yeshua sabia disso, lhe disse pelo olhar que lhe passou.
Então novamente vistoriou os outros, e os viu terrivelmente presos na dor que eram.
- Sim, quando isso ameaça vocês – ouviu Yeshua. - Por eons os observamos e, apesar de tanto desejarmos, não interferimos. Porém, vemos que estão despertando, e só encontrando mais dor no que encontram. Não é isso o que desejam, todos sabemos disso. Num abraço os vemos se perguntando quando a escuridão irá recuar, e lhes digo que a forma como são confrontadas só as reforçam e as fazem mais determinadas a avançar e a dominar. Sim, é certo que temos que fazer-lhes frente, não aceitando que assim se comportem, e comungamos com vocês quando sentem que eles têm que ter um limite, mas não podemos esquecer que também nós temos que encontrar o nosso limite.
Então Sênior sentiu que sua mente explodiu, e nos estilhaços seguiu tudo o que tinha acontecido com eles, desde que encontraram Aden. A experiência sempre os puxava, porque era isso que eles queriam. E então sempre ficavam na borda da sombra espessa, brincando de nela se perder. Esse era o caminho que, via agora, acabariam por tomar, o de cair profundamente nela.
Sênior levantou os olhos e passou assustado por cada um de seus irmãos. Ali estava tudo o que vinha ferindo-o, exigindo sua atenção e cuidado. Inspirou profundamente, como se tivesse encontrado ar fresco que há muito tempo lhe fora negado. Em paz e revigorado sorriu para aquele ser.
Assim se deixou aberto para cada tardischs ali, enquanto se deixava em paz, observando descuidado cada um dos outros que flutuavam em volta da pequena reunião, como uma nuvem de anjos, brilhando como pequenos sóis.
Seu mundo voltava a se iluminar.
Então ali estava novamente o silêncio, e todos os tardischs pareciam ter despertado também. Eles o observaram por algum tempo, e então também desceram suas barreiras e se mostraram.
- Esse é o caminho, Sênior? - perguntou Anaita, a face dolorida, apesar de luminosa. E, tal como os outros, era fácil ver quanta esperança aquela pergunta encerrava.
- Ah, sim, minha querida irmã. Por um tempo longo demais nos acreditamos defensores da luz, e mais escuridão criamos, e mais escuros ficamos. O caminho que trilhamos, até agora, foi apenas... um caminho, uma parte da experiência, da qual já me satisfiz. Esse não é mais o caminho que quero para mim. Guerreiro sim, mas sem essa carga pesada de ódio e raiva, de me sentir responsável pela escolha dos outros.
- Também não quero mais esse caminho – confessou com um choro contido de alívio.
E todos os tardischs, um por um, abdicaram da raiva e do ódio, e em paz se recolheram por fim.
Quando Haamiah se despediu e se recolheu, Sênior ficou observando Yeshua por algum tempo.
- Não foram só aqueles escuros que você trouxe para a luz – murmurou agradecido.
- Eu os vejo há muito tempo, Sênior, e pedi e fiquei aguardando que meu Pai me desse a oportunidade de estar com vocês. Ah, meus queridos amigos, vocês nunca foram responsáveis pelas escolhas dos outros – Yeshua falou.
- Sabemos disso, mas o que nos atormenta são as nossas escolhas. Escolhemos deixar ao lado em um momento, e depois escolhemos enfrentar, e ela era uma fúria aumentada quando a reencontramos – contou Haamiah. - Sempre a mesma resposta é o que recebemos.
- Isso porque essa experiência não é sobre vocês, tardischs, mas sobre... o UM. Certo e errado não há.
- E quanto a você, a Denatiel, a Emanoel?
- Lutamos com compaixão. Lutamos com firmeza, nunca esquecendo que se trata de irmãos do outro lado, que estão apenas curiosos sobre um caminho. Sabe, tal como vocês, já vi anjos se tornando demônios, e demônios se tornando anjos, e já muitos deles repetindo esse mesmo caminho muitas e muitas vezes, de formas cada vez diferente, experimentando possibilidades. Relaxe, meu irmão. Lute, mas entenda que tudo é sobre irmãos...
Sênior inspirou profundamente, e sorriu aliviado e mais relaxado, se dizendo que não podia se esquecer do que realmente importava, do que realmente eram as coisas, apesar de esquecer disso ser muito comum e fácil.
Por algum tempo ficaram conversando, até que os tardischs se foram, e somente Yeshua e Sênior permaneceram, felizes pela alegria no acampamento.
- Então, atenderão o convite do conselho? – Yeshua perguntou.
- Sim, estamos indo para lá amanhã mesmo. Quando o sol nascer sobre essas montanhas nós partiremos.
- Preocupado?
- Um pouco. Vão nos julgar, isso é mais que certo.
- Todos comentam que os tardischs não são muito afeitos a uma ordem de comando – sorriu. – Guerreiros... Sei que vocês batalham com o coração. Mas, se sairá bem, se sairão bem... – tranquilizou.
- Acredita que iríamos cair profundamente? – Sênior perguntou, quebrando aquele momento de silêncio.
- Sempre há um risco, meu querido irmão, mas tenho certeza de que nunca foi o desejo de suas almas. Alguns vão cair, sim; alguns agora, outros mais tarde, mas não porque desejam a experiência que a escuridão pode proporcionar, não vocês. Mas, sei que já sabe, que um de seus irmãos irá cair muito profundamente, e isso não vai demorar. Aquele que luta com tanta veemência e pragmatismo para defender o que vê como certo traz em si um grande risco para si mesmo. Se ver forte e aos outros fracos traz dor e desesperança.
- É, eu sei. Eu o venho observando, e seus pensamentos e sua vontade são muito fortes nesse caminho. Temo que se algo se interpor no caminho que traçou ele possa se perder...
- Ele irá se perder, meu amigo. Mas, como nada é perdido, quando ele se levantar será como um carvalho que se elevou de uma pequena semente. Sem julgamentos, mas apenas compaixão... Esperança, meu amigo...
- Bem sabe que rezamos por esperança, por paz, dias alegres, pela luz tocando o fundo das cavernas sombrias, mas... Yeshua, não imagina o quanto sou grato a você, a vocês... – Sênior declarou, a voz suave e distante, cheia de esperança renovada. – É incrível essa experiência. O menor descuido e a escuridão se acumula, de uma forma perigosamente imperceptível...
- O bom, meu amigo, é que nunca estamos sozinhos. Mesmo quando acreditamos fielmente nisso, nunca estamos sozinhos - falou se levantando juntamente com Sênior.
Então Yeshua parou, os olhos sérios postos em Sênior.
> Ouça isso, meu amigo, e guarde em seu coração – falou, apoiando suas mãos sobre os seus ombros. – Há certos caminhos escolhidos que são testados, ainda mais quando sobre nós pesa algo assim tão grande, como resistir ao avanço da escuridão.
- Eu acho que sei do que está falando, Yeshua, e aceito isso.
- Sei que sabe, como sei que não é do seu feitio abandonar um caminho onde a luz se mostra. Mas, o risco desse caminho, para você, será muito alto.
- Como você mesmo disse, meu amigo, tudo vai dar certo. Sei que não estou sozinho – falou sorrindo suavemente, tomando os dois o caminho na direção dos outros.
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